sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Choque de gestão parte III

Eu percebi que a minha realidade alternativa sobre o investimento de R$1,2bilhão na nova Cidade Administrativa Minas Gerais ficou meio obscura. Muito número, pouca explicação.

Então, para quem quiser entender a minha conta, vou deixar tudo detalhadamente explicado aqui embaixo.

1) Inicialmente, o dinheiro investido no CAMG, seriam R$948milhões, de recursos da Codemig, oriundos de royalties de mineração. Ainda ano passado, essa conta foi aumentada em 26,6%, não sei por quê e não sei com que recursos. Isso totalizou no custo das obras aproximadamente R$1,2bilhão.

Acredito que esse valor se refere apenas às obras, dinheiro pago apenas às empreiteiras. Gastos com desapropriações, mudança, instalação de telefones, compra de móveis, softwares, projetos ambientais obrigatórios etc não estariam contabilizados aqui.

2) Com aluguéis de imóveis, a economia anual estimada é de R$30milhões.
Recentemente, li uma matéria afirmando que outros R$55milhões seriam economizados com transporte e telefone. Como eles conseguirão dobrar a economia de aluguéis de imóveis só evitando alguns telefonemas e deslocamentos, eu ainda estou imaginando como é possível. Sou servidor estadual, me responsabilizo por orçamentos, planejamentos anuais e mensais, e afirmo de cadeira: não tem como gastar tanto assim por ano só com esses serviços parciais. É só pensar na sua casa: anualmente você paga mais visitando seus parentes e ligando para eles do que com aluguel e condomínio do seu lar? Este número está muito suspeito, então, por ora, vou confiar só nos 30milhões mesmo.

3) Então, a minha primeira conta foi a mais simples possível:
Tempo para zerar o investimento = T
Custo da obra: R$ 1.200milhões
Economia estimada para o empreendimento: R$ 30milhões a cada ano

Portanto,

Tempo "T" = 1.200milhões / (30milhões/ ano)
T = 40 anos.

4) Donde se conclui que o argumento da economia só é válido se considerarmos que começará a ter efeito no longuíssimo prazo e a conta-gotas.

5) Daí, o que eu questionei foi o seguinte: se a intenção é fazer economia, por que não colocar toda essa grana num investimento de baixo risco? Pegaríamos todo esse recurso da Codemig, mais aumento, já existente, e colocaríamos tudo de uma vez numa poupança, por 40 anos, que é o mesmo prazo que o governo quer que esperemos para zerar o custeio com a economia anual gerada.

6) Note que, além de ter "perdido" 1,2bilhão por 40 anos, continuaríamos gastando 30milhões por mês, com aluguéis de imóveis.

Não quero deixar dúvidas, e faço questão que fique bem claro, que não eliminei gasto nenhum para esse cálculo. Ao contrário, o dinheiro "gasto" teria sido duas vezes R$1,2bilhão: uma vez colocando esse valor na poupança e a outra pagando-se os aluguéis, por 40 anos. Sei que isso seria possível, porque esse dinheiro já existe, tanto que já está sendo pago às empreiteiras, ao mesmo tempo em que os aluguéis da administração estadual continuam sendo pagos, hoje.

7) Convencionalmente, utiliza-se um rendimento de 0,6% ao mês para poupança. Mas resolvi ousar e diminui um pouco, para 0,55%, para ser pessimista. Da mesma forma que eu poderia ter sido otimista, aplicando em outros fundos, com rendimentos superiores a 1% a.m.. Mas escolhi o caminho pessimista.

8) Então a conta ficaria assim:
M (montante) = R$ 1,2bilhão (investimento) x (1+0,0055 (rendimento))^480 (meses)
M = R$16,7bilhões, aproximadamente (aqui está o Easy Calc que não me deixa mentir)

9) Logo, o retorno líquido dessa poupança imaginária seria

R$16,7bilhões (valor final) - R$1,2bilhão (investimento incial) = R$15,5bilhões (valor ganho, isento do valor investido)

10) Então, no final desses 40 anos, devolveríamos esse 1,2bilhão para a Codemig e compensaríamos os 30milhões anuais (ou R$1,2bilhão acumulado) "jogados no lixo" (como já vi dizer) com aluguéis.

Podemos fazer isso de duas formas:
a) a mais lógica, compensando o valor bruto:
R$15,5bilhões (retorno líquido) - R$ 1,2bilhão (gastos acumulados com aluguéis em 40 anos) = R$ 14,3bilhões de saldo.

b) ou a mais complicada, fazendo uma média anual do quanto foi economizado, no final desses 40 anos:

Média anual de saldo = Média anual de retorno líquido da poupança - gasto anual,

donde Média anual do retorno líquido = (retorno líquido da poupança / anos de investimento)

Em números, a conta fica assim:

Média anual de saldo = (R$15.500milhões / 40) - R$30milhões
Média anual de saldo = R$387,5milhões - R$30milhões
Média anual de saldo = R$357milhões

Isto é: investindo nessa poupança fictícia, ao invés de estarmos perdendo R$30milhões por ano em aluguéis, estaríamos ganhando mais de dez vezes esse valor, por ano.

11) Só pra ilustrar a conta de maneira mais simples, resolvi determinar o retorno desse investimento após apenas um ano, que o Easy Calc chegou em R$81,6milhões. Valor ainda com retorno 72% acima dos 30milhões economizados. O que quer dizer que, sem o CAMG, já no primeiro ano, o Estado poderia continuar pagando os aluguéis, que conseguiria resgatar a mesma quantia da poupança e ainda sobrariam mais de R$50milhões para ser reaplicado. E, como são juros compostos, esse saldo aumentaria geometricamente com o tempo.

E isso, porque fiz uma conta pessimista, com um investimento que já é o mais conservador disponível.

12) Do que concluo que, do ponto de vista do princípio da economicidade e, de certa forma, da eficiência, o CAMG é um investimento desperdiçado até o último centavo, já que o tempo de espera para retorno não compensaria e absolutamente qualquer outro investimento teria sido anos-luz melhor.

Preciso deixar claro também que, do ponto de vista gerencial, de integração, de modernidade, de agilidade, de desenvolvimento e outros possíveis, não entro no mérito, não é a questão aqui. Disso, eu poderia criticar o governo alegando a questão de prioridades, como já li em outro blog. Isto é, como é que se justifica isso? Tanto dinheiro numa obra faraônica, quando o Ipsemg está caindo aos pedaços (como disse o mesmo blog); ou quando colegas meus, professores estaduais com graduação, ganham menos de três salários mínimos por mês; ou quando eu mesmo tenho que cortar gastos no meu serviço onde não tem como gastar menos; ou quando suspendem concursos importantes em cima da hora, por falta de dinheiro; ou quando abusam de terceirizações (diminuindo a qualidade do serviço público), para diminuir os gastos; ou muitas outras incongruências...

Dissequei tanto esse investimento, porque, em primeiro lugar, é o meu e o seu dinheiro em jogo. E, em segundo lugar, foi, talvez, o primeiro e maior motivo para justificar essa gastança estratosférica.

13) A título de curiosidade, a revista Viver lançou uma edição em janeiro, "atualizando" a economia anual para R$85milhões (como já disse no início do texto e considero um número super-inflado). Para não restar dúvidas do desperdício, resolvi fazer uma conta rápida com esse número também.

Nesse caso, para o CAMG compensar a conta, demoraria bem menos, 14 anos ou três mandatos e meio.

Mas ainda é um tempo considerável, a julgar que, analogamente, o partido do governador se vangloria do sucesso de venda da Vale do Rio Doce, que demorou apenas um semestre para recuperar o valor investido. Sem falar que, hoje, após quase os mesmos 14 anos, a empresa tem o valor de mercado quase 6.000% do que a União recebeu por ela. Ressalto aqui o detalhe para a diferença de critérios econômicos desse partido, quando é para o capital privado investir em patrimônio público e quando é para o capital público investir no patrimônio privado. De chefes de poder que são festejados como "bons" administradores e até exemplos a serem seguidos.

14) Voltando ao cálculo, o Easy Calc me ajudou de novo: no mesmo tempo, em 14 anos, a mesma poupança também teria devolvido o dinheiro à Codemig, também teria reembolsado o Estado dos gastos com aluguéis, e, de lambuja, ainda sobraria mais de 50% do valor investido. Isto é, o Estado teria, de graça, R$615milhões residuais, mais que o suficiente para construir, com responsabilidade e respeito ao cidadão, um Centro Administrativo funcional, moderno e na mesma localização, mas sem firulas e luxos desnecessários.

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